Como vai a cultura da sua empresa? Ela incentiva a motivação e o desempenho de seus trabalhadores – ou leva-os a desistir silenciosamente...? Colunista do Agro Olhar explica como você pode moldar a sua cultura organizacional para apoiar a satisfação e o empenho de suas equipes.
Beatriz Coningham é doutora em Desenvolvimento de Recursos Humanos pela George Washington University em Washington, D.C., e presidente da empresa de consultoria Habilis Global.
Nesta série de artigos estou explorando o tema de Quiet Quitting. Para relembrar, Quiet Quitting é a opção que um trabalhador faz de desistir silenciosamente. Ou seja, a pessoa não se demite, mas está desengajada. Faz somente o mínimo necessário para exercer a sua função. Mentalmente e emocionalmente já se desligou da empresa. Não faz esforço extra, não toma iniciativa, não inova.
No artigo da semana passada, o tema foi como comportamentos de liderança podem incentivar – ou desincentivar – os trabalhadores de uma empresa, levando-os a Quiet Quitting. Hoje quero falar sobre a cultura organizacional e como ela afeta o engajamento das pessoas que compõem a organização.
Começando pelo começo: O que é essa tal de cultura organizacional?
Edgard Schein, professor emérito do Massachussets Institute of Technology (MIT) é o pesquisador e autor mais conhecido ao redor do mundo quando se trata de cultura organizacional. Schein começou a desenvolver a sua teoria quando, como consultor, percebeu que cada empresa com que ele trabalhava era diferente e única. Informalmente ele define cultura organizacional como “o jeito de fazer as coisas” de uma empresa. Ao longo de sua história, uma empresa aprende a resolver problemas e à medida que isso acontece, ela vai adotando artefatos, valores e formas de pensar que vão tornando-se parte do seu “jeito” de conduzir o seu dia-a-dia e existir como organização.
Que tipo de cultura organizacional atrapalha os trabalhadores e o progresso da própria empresa?
Aqui vai a minha classificação, direto do forno:
Cultura Quebra-Molas: Aquela cultura em que para conseguir qualquer coisa o trabalhador tem que superar múltiplos obstáculos, o maior deles sendo a “burrocracia”. Não se consegue nada sem preencher formulários. E em todos os formulários é preciso incluir informação que já foi fornecida nos anteriores. Os processos são complicados e ninguém os questiona. As políticas da empresa estão escritas em legalês e não se consegue entendê-las nem com PhD em Direito. Para complementar, são difíceis de achar e tão extensas que o trabalhador começa a lê-las mas no final da primeira página já tem que parar e ir pra sua próxima reunião de Zoom.
Esta cultura distrai seus trabalhadores de seu trabalho importante com tarefas que não adicionam valor. O tempo que a pessoa passa para preencher formulários repetitivos ela poderia ter investido em resolver um problema importante para a empresa. Mais cedo ou mais tarde, depois de cansar de dar murro em ponta de faca, o trabalhador acaba desistindo. Silenciosamente.
Cultura Torre de Babel: Aquela cultura em que pra tudo tem que fazer reunião. Geralmente isto é um sintoma de uma cultura em que falta claridade sobre quem decide o quê, quem deve ser consultado e quem deve ser informado sobre quais assuntos. Então, como o trabalhador não sabe quem tem a autoridade adequada, convida todo mundo para uma reunião. Se o problema for falta de claridade, é bem possível que todos saiam dessa reunião sem uma decisão e precisem marcar pelo menos mais uma ou duas até chegar a uma resolução.
Este tipo de cultura também pode ser resultado de um modo de pensar que é: Se eu não convidar todo mundo alguém pode sentir-se ofendido. Ou ainda: Eu nem sei por que eu estou sendo convidado para esta reunião, mas se eu não aceitar o convite, alguém pode sentir-se ofendido. Com esses medos por trás do imenso número de reuniões, as pessoas passam mais tempo falando do que trabalhando nas suas prioridades. Esta cultura costuma ser fonte de grande ansiedade. A pessoa passa o dia inteiro em reuniões, angustiando-se com a pergunta: a que horas vou ter tempo de fazer o meu serviço? Ansioso e exausto de tanto ficar em reuniões desnecessárias, o trabalhador começa a desistir. Silenciosamente.
Cultura Telefone Sem Fio: Aquela cultura em que todo mundo é “chefe”. A é chefe de B que é chefe de C que é chefe de D que é chefe de E que é chefe de F que é chefe de G. Quando A decide alguma coisa, já pensou o que vai chegar até G nessa brincadeira de telefone sem fio? E já imaginou com quantas pessoas G tem que falar para conseguir uma decisão de A? Frequentemente G vai simplesmente desistir. Silenciosamente.
Este tipo de cultura geralmente ocorre porque não há alternativas de aprendizagem e carreira. Para reter os trabalhadores, cargos de chefia são criados e uma ou duas pessoas passam a se reportar para aquele cargo. Níveis hierárquicos acumulam-se, engessando a organização e tornando-a vagarosa em suas respostas ao mercado ou à comunidade que serve. As pessoas nos cargos mais altos perdem o contato com o dia-a-dia do trabalho e já não entendem os desafios que suas equipes precisam manejar corriqueiramente. Perdem também o contato com o cliente, que possivelmente foi parte da sua motivação inicial para unir-se a empresa. Pessoas nos cargos mais altos podem, também, desistir silenciosamente.
Cultura Cortisol: Esta cultura organizacional é literalmente tóxica. Pessoas em cargos de liderança tratam mal suas equipes e colegas em outras funções, fazem exigências irrazoáveis, tomam decisões com base em favoritismo, não demonstram gratidão ou reconhecimento quando alguém completa tarefas complexas ou atinge resultados excepcionais.
Este tipo de cultura é geralmente também caracterizado por um ambiente de fofocas e competição exagerada – ao invés de transparência e colaboração. Os trabalhadores que estão mais expostos a comportamentos abusivos vão adoecendo mental e fisicamente devido ao estresse, e perdendo o interesse pelo trabalho. Desistindo. Silenciosamente.
Mas tudo não está perdido. As culturas organizacionais não são estáticas. Elas são dinâmicas e estão em constante evolução.
Como transformar a cultura da sua organização para propiciar emoções positivas, percepções favoráveis da organização e de seus colegas, motivação e bom desempenho?
Na semana passada eu mencionei a pesquisa de Teresa Amabile e Steve Kramer (veja o livro O Princípio do Progresso). Amabile e Kramer demonstraram que há eventos que nutrem as pessoas e propiciam o desempenho. Os “nutridores” são aqueles eventos interpessoais que estimulam as pessoas positivamente. Por exemplo: palavras de encorajamento e agradecimento, demonstrações de respeito e coleguismo.
Os “catalisadores” são aqueles eventos que facilitam diretamente o trabalho em um projeto. Por exemplo: metas claras e autonomia para tomar decisões, equipamentos e recursos necessários para a execução satisfatória das responsabilidades da pessoa.
Além disso, um dos mais fortes elementos motivadores é a possibilidade de focar e trabalhar nas próprias prioridades e sentir que se está fazendo progresso – daí o título do livro. Quando os comportamentos nutridores e catalisadores transformam-se na regra ao invés da exceção, cria-se uma cultura organizacional que energiza as pessoas e impulsiona a empresa.
Mas além de incorporar elementos positivos à cultura organizacional, é muito importante também eliminar as “toxinas” (eventos que desencorajam e minam a auto-estima das pessoas, tais como críticas ríspidas, desrespeito e desprezo pelas emoções e sentimentos da pessoa) e os “inibidores” (eventos que não só deixam de expressar apoio às pessoas para que realizem seu trabalho como também atrapalham. Por exemplo: burocracia, interferências e interrupções, equipamentos ou recursos insuficientes, confusão e falta de clareza sobre prioridades, funções, processos e normas).
Estando ou não em posição de liderança, você pode influenciar positivamente a cultura da sua empresa.
Para começar, seja o exemplo. Adote os comportamentos nutridores e catalisadores, e elimine os comportamentos tóxicos e inibidores. Se você for chefe de uma equipe, incentive a sua equipe a fazer o mesmo. Sucesso!
Com este artigo eu concluo a série sobre Quiet Quitting. Espero que você tenha encontrado informações úteis para desenvolver a sua liderança e a sua carreira. Se tiver perguntas ou sugestões para a coluna, por favor use o espaço para comentários. Até breve!