O primeiro levantamento das intenções de confinamento em Mato Grosso, feita pelo Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), mostra que a estimativa da quantidade de animais confinados em 2020 é de 577.550 cabeças. A pesquisa foi feita em 173 unidades de confinamento, representando 71% do total. Esse valor é 16% menor em relação a abril de 2019 e quase 30% se comparado com outubro, quando foi realizado o levantamento final do ano passado.
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A Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat) destaca que este cenário reflete na capacidade estática do estado, uma vez que quatro propriedades desativaram a estrutura de confinamento.
"Isso pode justificar a menor quantidade de unidades confinadoras neste levantamento. Assim, a capacidade estática em 2020 será de 811.230 cabeças, valor 8,62% menor do que 2019", aponta o levantamento.
Dentre as regiões, somente a centro-sul possui previsão de aumentar a quantidade de animais confinados neste ano, com variação de 3,23% a mais em comparação com 2019. As outras regiões demonstram cautela: produtores sem previsão de confinamento somam quase 15% este ano, frente aos 31,7% que informaram que não irão confinar.
Mais de 70% dos animais devem ser confinados em estruturas próprias, enquanto o restante em estrutura de terceiros.
O Imea analisa que é normal o produtor apresentar um comportamento mais moderado no primeiro levantamento do ano, reflexo da necessidade de estudo do mercado futuro, dentre outras ações. Dentre as principais preocupações do pecuarista estão a cotação do boi gordo; pandemia da Covid-19; preços dos insumos de suplementação e as cotações dos animais de reposição.
Essa quantidade restante, como dito anteriormente, pode estar atrelada à preocupação dos confinadores com o aumento dos preços dos animais de reposição. Isso porque as cotações destas categorias estão em crescimento desde o segundo semestre de 2019, sendo que no final do ano a alta começou a ser mais intensa.
Este movimento tem sido causado pela menor oferta destes animais, devido ao momento do ciclo pecuário proporcionado pelo maior abate de fêmeas nos anos anteriores. Além disso, a exportação de carne bovina para a China também é um fator que tem impulsionado as cotações no mercado de reposição, pois os volumes enviados estão satisfatórios e o produto demandado pelo mercado chinês é de animais jovens, o que acaba valorizando estas categorias.
Compra de animais e insumos
Em relação à aquisição dos animais, mais de 50% dos produtores já efetuou a compra. Se a previsão do rebanho confinado se manter, há ainda 251.799 animais que precisam ser adquiridos.
A compra de insumos, por sua vez, está na média de 75%. Este cenário está 15 p.p acima de abr/18, o que pode ser pautado na maior preocupação com a competitividade de milho com as usinas de etanol. Neste levantamento, inclusive, foi observado mais pecuaristas com própria produção do cereal.
Contudo, neste ano, apesar das estimativas de aumento de safra, o consumo das usinas de etanol ainda é alto. Esta conjuntura não traz perspectivas de queda nos preços do milho a curto prazo.
Cautela
A conjuntura econômica ainda instável após o novo coronavírus tem mantido o pecuarista mato-grossense cauteloso.
"O primeiro elemento de preocupação do pecuarista é o custo de produção em confinamento. Os insumos relacionados à nutrição animal e a aquisição de animais para engorda aumentaram e podem negativar a rentabilidade do confinamento", contextualiza o zootecnista Bruno Andrade, especialista em confinamento.
Além disso, ele afirma haver uma expectativa de redução no consumo interno de carne bovina, devido aos impactos econômicos gerados pela Covid19. "Já em relação às exportações, o cenário, hoje, é positivo", pontua.
Apesar do levantamento indicar uma retração na intenção de confinamento, Bruno Andrade enxerga no estudo do Imea algumas oportunidades para o mercado da carne em Mato Grosso. Uma delas é o fato de que 43,6% dos pecuaristas ainda não adquiriram seus animais para o processo de engorda em confinamento.
"Não deixa de ser uma oportunidade, pois o comportamento do mercado está sendo construído dia a dia, e a carne de Mato Grosso tem ativos sólidos, que se tornam mais valiosos em uma conjuntura onde importantes produtores diminuem o ritmo de abate e se discute a questão sanitária da produção".
De acordo com o zootecnista, o maior ativo é a qualidade da carne produzida em Mato Grosso. Além da grande capacidade quantitativa de produção, o estado é reconhecido pela excelência da carne que entrega ao consumidor final – fruto de investimentos que vêm sendo realizados há décadas no setor.
"Temos o maior rebanho e Mato Grosso é o segundo estado brasileiro que mais confina. Aprendemos a produzir uma carne de grande qualidade", pondera Bruno Andrade.
Números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) atestam essa qualidade. De 1999 a 2019, o peso da carcaça do boi mato-grossense aumentou 39,6%, superando a variação nacional, de 15,8%.
Além de um crescimento consistente ao longo desses 20 anos, Mato Grosso tem um desempenho superior à média nacional: enquanto, em média, o boi em Mato Grosso rende 20,8 arrobas por carcaça, a média nacional é de 19,29 arrobas por carcaça.
"Em outras palavras, isso pode significar melhor genética, mais manejo e suplementação nutricional sendo empregados nas fazendas mato-grossenses", explica.
Além da qualidade propriamente dita da carne de Mato Grosso, o especialista identifica outra oportunidade nos números divulgados pelo Imea. "Ainda há espaço para bons negócios, principalmente para quem faz o dever de casa", afirma. E esse dever de casa, além da gestão rural propriamente dita, inclui escolher ferramentas para intensificar a produção com uma melhor relação custo/benefício para o criador.
"O confinamento em si é uma dentre várias alternativas. O pecuarista consegue obter animais com mais qualidade investindo em suplementação alimentar, realizando semi-confinamento ou integração lavoura-pecuária, por exemplo", comenta o zootecnista. A disponibilidade de proteína para a dieta animal, e a preços mais acessíveis que em outros estados, é uma vantagem que deve ser aproveitada.
Lançar mão de mecanismos de proteção de preço, como a negociação em bolsa ou via contratos a termo devem estar no rol de opções do produtor. O levantamento do Imea indica um leve aumento no número de pecuaristas que utilizam proteção via B3, somando apenas 6,31% do total de entrevistados. "Neste momento, produtor e indústrias estão sem saber como avaliar o mercado interno, o que explica esse comportamento mais cauteloso", analisa o zootecnista.