A geração de conhecimento e a transferência de tecnologias desenvolvidas tem sido a principal contribuição da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) no projeto coordenado pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) para criação do pirarucu em cativeiro nos estados da região Norte do país.
Detalhes sobre as metodologias para desenvolvimento destas tecnologias e o seu compartilhamento foram apresentados pela coordenadora do Projeto Pirarucu pela Embrapa, Adriana Ferreira Lima, durante o III Workshop de Cultivo de Pirarucu ocorrido nos dias 22 e 23 de novembro em Belém (PA).
Engenheira de Pesca com mestrado em Recursos Pesqueiros e Aquicultura e atuante na área de sistemas pesqueiros e aquícolas e reprodução de peixes, Adriana destaca que a preocupação da Embrapa é fazer com que pesquisas e o conhecimento desenvolvido estejam disponíveis ao setor produtivo.
Ela admite, no entanto, que existem mais informações e tecnologias desenvolvidas para as espécies exóticas do que para as nativas e que o desafio deste projeto é produzir e compartilhar conteúdo qualificado para a criação do pirarucu, habitante das bacias Amazônica e do Araguaia-Tocantins e produto com alto valor de mercado.
“As tecnologias para espécies nativas estão muito aquém das tecnologias para as espécies exóticas no país. Por isso, a Embrapa tem preocupação de fazer com que pesquisas cheguem ao setor produtivo”, pontua.
Para superar este passivo, a prospecção tecnológica foi uma das primeiras ações desenvolvidas pela Embrapa Pesca e Aquicultura nesta parceria iniciada em 2007 pelo SEBRAE e com o apoio do Ministério da Pesca (MPA), universidades e instituições locais para geração de emprego e renda a pequenos produtores rurais do Acre, Amazonas, Amapá, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins.
Leia mais:
Pirarucu tem 95% de aprovação nos supermercados do País e começa a ganhar o mundo
Cursos em Apicultura e Piscicultura levará mais qualificação para produtores de comunidades de MT
Segundo a palestrante, como a criação do pirarucu em cativeiro era uma atividade até então inexistente na região, a Embrapa utilizou-se da experiência adquirida na implantação de rebanhos bovinos no bioma cerrado, na década de 1970, para desenvolver uma metodologia adaptada à realidade local.
“A Embrapa buscou descrever os cenários tecnológicos da produção do pirarucu na região Norte. Fizemos um paralelo ao que a Embrapa fez para o bovino na década de 70 no cerrado. Na época não existiam informações sobre a criação na região. E muitos produtores foram consultados nesta etapa”, destaca.
Mapeamento
O mapeamento das tecnologias já utilizadas pelos produtores da região foi a primeira medida adotada. O objetivo, segundo Adriana, foi montar um cenário destas tecnologias e compartilhar o conhecimento. Os dados fornecidos pelos produtores serão apresentados posteriormente em um workshop a ser realizado pelo fórum do setor produtivo.
A Embrapa também fez o acompanhamento das unidades de observação para validar as tecnologias geradas na primeira fase do projeto, entre 2007 e 2010, e que constam dos manuais de boas práticas do SEBRAE.
“A Embrapa está acompanhando a validação destas tecnologias para ver a visão geral entre os estados e incluirmos este conhecimento nos padrões de tecnologia adotados pela Embrapa a partir de agora”, ressalta.
A Embrapa Pesca e Aquicultura trabalha com o setor produtivo apresentando o resultado destas prospecções tecnológicas, auxiliando produtores, juntamente com o SEBRAE, no processo de capacitação do que foi desenvolvido junto com as unidades de observação e das pesquisas desenvolvidas no projeto.
Rastreabilidade
A engenheira conta que a Embrapa desenvolve um sistema de rastreabilidade genética para descobrir, a partir de alevinos ou amostras de pescados, se esse peixe veio do ambiente de cultivo. De acordo com Adriana, uma das etapas deste processo é o gerenciamento genético.
“Temos de ter o perfil do material genético de reprodutores atualmente. Para isso estamos levantando esse material para ver a diversidade desses peixes e propor um manejo genético desses planteis, evitando endogamia e a mistura indiscriminada de populações de diferentes locais. Muitos piscicultores já cederam o material genético que vai compor esse sistema que é fruto dessa análise, mas que também vai ter uma resposta um pouco mais a frente de como está o plantel genético para reprodução”, esclarece.
Reprodução
Em outra etapa, a Embrapa deu início à utilização de morfometria e ultrassonografia para identificação do sexo dos peixes em tamanho próximo do abate comercial, em torno de 10 e 12 kg. O objetivo é evitar que o produtor invista em alimentação de forma inadequada sem conhecer o número de machos e fêmeas que ele precisa para o abate.
Ainda nesta área, a Embrapa pretende disponibilizar aos produtores kits para avaliação de hormônios e avaliar a correta formação de casais. Segundo Adriana Ferreira Lima, até então a formações de casais do pirarucu era feita deixando que os animais se formassem aleatoriamente.
O comportamento reprodutivo da espécie é observado por telemetria, equipamento que monitora as movimentações, as áreas de preferência dos casais em viveiro, assim como a interação desses animas marcados individualmente e a interação entre eles no acasalamento.
Manejo
A coordenadora lembra que o cultivo está sendo avaliado por fases de forma a conseguir animais mais uniformes e, posteriormente, lotes diferenciados com animais maiores sendo ofertados no mercado. O consumo de plâncton pelo peixe também é avaliado pela Embrapa para que o alimento natural seja um aliado para as ações de engorda.
O transporte das espécies, o uso de anestésicos e os métodos de aplicação também são preocupações da Embrapa.
“A gente precisa de um tempo de transporte às vezes um pouco maior para conseguir com que esse peixe chegue às unidades de produção. Também a questão do uso de anestésicos, a gente sabe que é um peixe difícil de trabalhar. Ele é um peixe que machuca, que é perigoso, então estamos buscando métodos de anestesia para que a gente utilize quando precisar coletar um sangue ou outro tipo de procedimento, trabalhar de uma forma melhor com esse animal”, explica.
As formas de abate para garantir qualidade à carne também estão sendo estudadas. Choque térmico, choque térmico mais sangria e outros métodos estão em análise pela empresa, assim como o aproveitamento maior da carcaça do animal após o corte.
Nutrição
Além da utilização de plâncton, a Embrapa busca uma ração que atenda as necessidades dos animais. Dezesseis ingredientes estão sendo analisados em razão da sua digestão dos pirarucus.
“O objetivo é apresentarmos uma tabela de digestibilidade para as indústrias, para o setor produtivo se orientar para termos uma base maior para a formulação dessas rações”, observa a engenheira.
A Embrapa também desenvolve um estudo comparativo entre o animal selvagem e o de cativeiro para avaliar as necessidades de aminoácidos dele e também estudos da anatomia e morfologia funcional que fornecerão informações sobre o conhecimento da habilidade e dinâmica do pirarucu na utilização dos nutrientes.
Sanidade animal
Para garantir a sanidade animal, a Embrapa trabalha em três linhas básicas: parasitologia, prevenção e tratamento, principalmente para alevinos, uma das demandas do setor produtivo.
“Estamos avaliando a influência de alguns parâmetros de água nessa questão de monogenóides (parasitas), principalmente na parte de temperatura, e também estudar esse ciclo biológico para saber onde vamos atuar para processos de tratamento”, ressalta.
A importância do comprometimento dos parceiros no projeto
Adriana Ferreira ressalta a importância de o projeto de criação do pirarucu em cativeiro ter sido desenvolvido pela Embrapa baseado em parcerias com entidades públicas e privadas.
Segundo a engenheira, todas as ações de pesquisa e transferência de tecnologia ocorrem em parceria com o setor privado, com os produtores, parceria com o SEBRAE, com os consultores, parceria com universidades e instituições de pesquisa.
Ela lamenta, no entanto, que nesse primeiro momento a Embrapa não consiga fazer parceria com outros segmentos.
“A gente espera, ao longo desse processo, aumentar nossas parcerias, que a Embrapa realmente consiga trabalhar mais em conjunto com o setor produtivo, com as instituições que estão trabalhando atualmente com o pirarucu”, ressalva.
Apesar das dificuldades, a engenheira reconhece o esforço dos parceiros envolvidos. “Fizemos um trabalho conjunto com o SEBRAE e instituições de pesquisa, universidades, institutos federais que estão sendo parceiros e estão contribuindo para o desenvolvimento dessas ações. De antemão, a gente já agradece grandemente os produtores que estão colaborando demais com a gente com diversas ações, o SEBRAE, os consultores, as instituições de pesquisa que são nossas parceiras”. finaliza.