SUA EQUIPE ESTÁ DESISTINDO EM SILÊNCIO? POR QUE E O QUE VOCÊ PODE FAZER
Beatriz Coningham é doutora em Desenvolvimento de Recursos Humanos pela George Washington University em Washington, D.C., e presidente da empresa de consultoria Habilis Global.
Os Estados Unidos publicam muitos estudos e artigos relacionados a Liderança, Carreira e Recursos Humanos, influenciando a linguagem e as práticas de Recursos Humanos no mundo inteiro. No meu primeiro artigo nesta coluna traduzi e comentei o conceito de
Quiet Quitting que tem sido bastante debatido aqui nos EUA.
Hoje quero falar sobre as causas de
Quiet Quitting, ou seja, do desengajamento dos trabalhadores de uma empresa, que pode ser danoso para o trabalhador e para a empresa.
Só para relembrar,
Quiet Quitting é a opção que uma pessoa faz de – disfarçadamente – abandonar o seu emprego. A pessoa não se demite, mas está desengajada. Faz somente o mínimo necessário para exercer a sua função. Mentalmente e emocionalmente já se desligou da empresa. Não faz esforço extra, não toma iniciativa, não inova.
Segundo o instituto de pesquisas
Gallup, o desengajamento dos trabalhadores custa 7,8 trilhões de dólares à economia mundial, o que equivale a 11% do PIB global. Portanto, é um problema que tem um impacto significativo de uma perspectiva macro. Mas o que mais me interessa é o seu impacto na experiência individual. Como eu mencionei no meu
artigo anterior, ficar em um emprego que não nos motiva e interessa mais é uma verdadeira tortura —não só para a pessoa, mas também para quem trabalha com ela e percebe o seu desinteresse. A falta de empenho pode também prejudicar a carreira de uma pessoa se ela estiver trabalhando em uma empresa onde a produtividade é avaliada e levada em consideração em decisões sobre promoções e salário.
Portanto, vale a pena resolver esse problema. Para isso, devemos entender as suas causas. Como podem ser várias, vou focar nas causas relacionadas a comportamentos de liderança, começando
com uma historinha de terror.
Numa certa manhã há alguns anos atrás, eu estava no elevador de uma empresa aqui nos EUA, quando entrou uma pessoa com aspecto desleixado e expressão facial irritada. Para ser mais precisa, essa pessoa estava “bufando”. Cumprimentei-o com um bom dia, como é de costume, e um sorriso discreto. “Você deve ser uma dessas pessoas que gosta de acordar cedo”, disse ele. “Eu detesto”, continuou.
Suspirei aliviada quando ele saiu do elevador, levando consigo a nuvem escura que pairava sobre sua cabeça. Por ironia do destino, assim que cheguei aos escritórios onde participaria de entrevistas para um emprego, lá estava ele. Confidencialmente fui informada de que era uma pessoa extremamente competente, que todos os anos conseguia resultados financeiros excelentes para a empresa. Detalhe: tinha um estilo ríspido, exigente e rígido. Era conhecido por fazer críticas e humilhar seus funcionários em público, levantar a voz quando insatisfeito com uma tarefa e manter a sua equipe permanentemente amedrontada. Seus colegas detestavam reuniões com ele, pois via defeito em tudo. Bloqueava qualquer ideia nova sem mesmo escutá-la direito. O terror veio na metáfora usada para descrever o efeito dessa pessoa na empresa: atingia ou ultrapassava todas as suas metas, mas deixava uma “trilha de sangue” pelo caminho.
Infelizmente, durante a minha carreira eu já conheci muitas pessoas em funções de liderança que exibem esses e outros comportamentos inadequados, causando a chamada “porta giratória” por onde trabalhadores entram e saem da empresa constantemente. Ou não saem, mas ficam desmotivados, fazendo o mínimo possível, como eu comentei no artigo anterior. Ou ainda: saem tão desgostos e desapontados que processam a empresa.
Se você está em posição de liderança, ou almeja tal posição, faça questão de não ser mais uma dessas pessoas que arrancam resultados das suas equipes à base de medo. Além de desnecessário, isso é improdutivo a médio e longo prazo. Você perde os membros mais capazes da sua equipe (principalmente num mercado de trabalho super competitivo como o atual), desenvolve uma reputação negativa para você e para sua empresa, e cria uma dependência doentia da sua pessoa – tem que decidir tudo ou aprovar coisas sem importância porque ninguém tem coragem de tomar uma iniciativa ou decisão algo sem a sua participação.
Além disso, você vai notar que aqueles bons resultados ficam mais difíceis de alcançar a cada ano que passa. Porque quando um trabalhador está desengajado, isso se reflete na forma como ele interage com os seus clientes, que vão buscar produtos e serviços nos seus competidores. Se o trabalhador desengajado é também um gerente de equipe, a sua falta de interesse será percebida pela equipe, que terá também a sua motivação e empenho diminuídos. E assim por diante. Está criado um círculo vicioso difícil de quebrar, uma cultura organizacional tóxica, que corrói a confiança das pessoas na sua liderança.
Portanto, vamos trocar o terror por comportamentos e técnicas de liderança inteligentes, que inspiram e fortalecem o que há de bom nas pessoas. Com um pouco de boa vontade você pode aprender a conseguir os mesmos resultados ou resultados ainda melhores, e fazer a vida de todo mundo ao seu redor muito melhor – inclusive a sua, porque estar irritado e bufando o tempo todo é péssimo para a sua saúde. Um bom ponto de partida é o livro O princípio do progresso: Como usar pequenas vitórias para estimular satisfação, empenho e criatividade no trabalho. Teresa M. Amabile, professora da Harvard Business School, e o pesquisador independente Steven J. Kramer são os co-autores. Para quem quiser praticar o seu inglês, um bom resumo do livro é o artigo The power of small wins, dos mesmos autores, publicado na versão online do Harvard Business Review.
Amabile e Kramer descrevem quatro categorias de eventos (que geralmente se devem a comportamentos por parte de líderes) e como esses eventos impactam as pessoas:
IMPACTO POSITIVO, FORTALECEM A MOTIVAÇÃO (ADOTE)
Ligados à pessoa:
Nutridores
Eventos interpessoais que estimulam as pessoas positivamente. Por exemplo: palavras de encorajamento, incentivo e agradecimento, demonstrações de respeito e coleguismo.
Ligados ao trabalho:
Catalisadores
Eventos que facilitam diretamente o trabalho em um projeto. Por exemplo: metas claras e autonomia para tomar decisões, equipamentos e recursos necessários para a execução satisfatória das responsabilidades da pessoa.
IMPACTO NEGATIVO, DIMINUEM A MOTIVAÇÃO (ELIMINE)
Ligados à pessoa:
Toxinas
Eventos que desencorajam e minam a auto-estima das pessoas. Por exemplo: críticas ríspidas, desrespeito e desprezo pelas emoções e sentimentos da pessoa.
Ligados ao trabalho:
Inibidores
Eventos que não só deixam de expressar apoio às pessoas para que realizem seu trabalho como também atrapalham. Por exemplo: burocracia, interferências e interrupções, equipamentos ou recursos insuficientes.
Um esclarecimento: Produtividade, engajamento, motivação, esforço e empenho no trabalho não são sinônimos de escravidão. Eu não estou sugerindo que as pessoas se matem de trabalhar. Pelo contrário. Seu desempenho e da sua equipe vai ser melhor se você focar suas energias, ficar atento e presente, tiver clareza e atenção às suas prioridades. Tudo isso requer estar descansado e tranquilo para enfrentar os desafios de cada dia. Uma liderança inteligente pratica Nutridores e Catalisadores, e também incentiva as pessoas a terem tempo para sua família e amigos, hábitos saudáveis e lazer. É mais fácil do que parece. Comece hoje.
Neste artigo eu falei um pouco sobre como a forma como se pratica a liderança pode levar os trabalhadores de uma empresa ao chamado Quiet Quitting. Mas e a cultura organizacional? Tem alguma parte nisso tudo? Passe por aqui na semana que vem para saber mais sobre como a cultura de uma empresa pode incentivar a motivação e o desempenho de seus trabalhadores – ou levá-los a desistir silenciosamente...