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Quinta-feira, 21 de novembro de 2024

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Lixo no chão, dinheiro no lixo

No dia 9 de abril de 2013, a Prefeitura do Rio de Janeiro declarou que adotará postura rígida com quem descartar lixo de forma indiscriminada e passará a multar a partir de julho deste ano. Quem for flagrado será multado, essa é a ordem.

A iniciativa lançada por meio do “Programa Lixo Zero” busca dar efetividade a mais uma norma que “não pegou”: A Lei Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro (Lei Municipal nº 3.273/2001), além de tentar provocar, mesmo que de forma tortuosa, a consciência social sobre a limpeza urbana.

As equipes de fiscalização serão integradas por três figuras: um agente de fiscalização da Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana do Rio de Janeiro), um guarda municipal e um representante da Polícia Militar, totalizando 500 agentes fiscais, ou seja, 166 equipes de fiscalização.

Estas equipes serão munidas de um palmtop, apto para lançar a multa pelo número do CPF do infrator, possibilitando, posteriormente, a inserção de seu nome no Serasa, no caso de inadimplência. Interessante, como instrumentos mirabolantes são criados para arrecadar fundos ao erário público.

É necessária cautela, antes de elogiar a iniciativa, pois existem diversos casos semelhantes a este sem sucesso, como o município de São Paulo, que publicou a Lei Municipal nº 13.478/2002 cujos resultados constituem em um verdadeiro fracasso. Para obter informações sobre a efetividade da norma, basta perguntar a qualquer munícipe de São Paulo se já presenciou alguém sendo autuado por abandonar lixo em logradouro público.

Com certeza, existem iniciativas semelhantes de sucesso, como “Roma Limpa” ou o caso de Miami, mas qual a realidade mais próxima do Rio? São Paulo ou Miami?

Nós, brasileiros, não consideramos nossas diferenças e adotamos sistemas e políticas baseadas em uma postura de gestão pública européia ou norte-americana não compatível à nossa realidade.

Outro aspecto importante a ser abordado é com relação as medidas que serão adotadas pelo poder público. O município impõe deveres aos cidadãos, em contrapartida, a pergunta que se faz é se existirão condições adequadas para atendê-las. Ou seja, o Estado cumprirá com seu papel em disponibilizar lixeiras em quantidade e tamanho suficientes? A periodicidade da coleta dos resíduos nas lixeiras atenderá a necessidade da cidade?

O presidente da Comlurb, Vinícius Roriz, afirma que o objetivo do programa consiste em diminuir gastos com a limpeza das ruas, que somam R$ 90 milhões por mês, aproximadamente 15% do orçamento da empresa. Além disso, a empresa não pretende comprar mais lixeiras ou papeleiras e quer contar com a conscientização da população.

Ora, é notória a pretensão contrária à lógica de gestão pública dos resíduos. O que se pretende é reduzir investimentos com limpeza e, simultaneamente, apenar aqueles que descartam lixo no chão. A iniciativa não conseguirá atingir a conscientização da população, mas sim, o oposto do pretendido.

Aqui, a crítica feita é com relação à factibilidade do programa, que depende não só do comportamento dos cidadãos, como também, em contrapartida, de investimentos públicos voltados à arrecadação monetária.

Com relação ao valor das multas, muitos entendem extravagantes, daí a pergunta: Qual a real finalidade da política? Coerção pedagógica ou mecanismo de arrecadação de fundos ao erário público?

Exemplo disso são os artigos 79 e 122 da Lei Municipal n° 3.273 de 2001, que estabelece o seguinte:

“Art. 79. As multas são progressivas conforme a seguinte série matemática: R$50,00 (cinqüenta reais), R$80,00 (oitenta reais), R$125,00 (cento e vinte e cinco reais), R$200,00 (duzentos reais), R$315,00 (trezentos e quinze reais), R$500,00 (quinhentos reais), R$800,00 (oitocentos reais), R$1.250,00 (um mil e duzentos e cinqüenta reais), R$2.000,00 (dois mil reais) e assim sucessivamente.

Parágrafo único. Quando explicitado, as multas poderão começar por qualquer outro termo da série prevista no caput deste artigo, que não o termo inicial.

Art. 122. Lançar nas sarjetas ou sumidouros quaisquer detritos ou objetos constitui infração punida com a multa inicial de R$50,00 (cinqüenta reais).”

Nos dispositivos apresentados, percebe-se a existência de ampla margem de discricionariedade concedida ao agente fiscalizador, devendo, logicamente, motivar a autuação.

Críticas exaltam a possibilidade da aplicação de multa incorrer em até R$ 3.000,00, contudo, percebe-se que se trata de possibilidade remota prevista na norma. É evidente que a arrecadação de valores ao erário público não é prioridade da norma, que não foge à razoabilidade e proporcionalidade no que diz respeito à sua real finalidade.

A efetividade e a seriedade da política devem ser observadas a partir dos resultados obtidos nos próximos meses. Notória a importância do programa para uma mudança de consciência da cidade.

O Brasil é um país sem construção de cidadania ou qualquer outro valor que crie preocupação com o coletivo. Uma possibilidade de sanção administrativa é apenas mais uma das diversas outras existentes.

Medidas sancionatórias com caráter isolado são ineficazes. Sem outras medidas educacionais e informativas, é possível que os cariocas, simplesmente, olhem para os lados antes de jogar seu lixo no chão.

*Andressa Onohara é Gestora Ambiental formada pela Universidade de São Paulo (USP). Advogada formada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Atua na área de Direito Ambiental.

**Ian Libardi Pereira é advogado, técnico em urbanismo e conservação ambiental pelo Centro Técnico de Formação Profissional e Educação Ambiental (CEFOPEA) e pós-graduando em gestão ambiental pelo SENAC.
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