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A terra como fator de desenvolvimento social
Autor: Wellington Fagundes
11 Out 2017 - 10:00
Desde os tempos do Brasil colônia, Mato Grosso ocupa lugar estratégico quando se trata da ocupação de terras, quer para definir a fronteira com as colônias espanholas (século XVIII), quer para preencher vazios populacionais e garantir a soberania nacional, como se deu com a chamada "Marcha para o Oeste", durante o governo Getúlio Vargas. Até então, a história da ocupação das terras no Brasil era baseada no latifúndio e as mudanças na estrutura agrária do país começaram nas décadas de 1950/60.
Mais recentemente, a estratégia incluiu o estímulo à migração de produtores rurais que enfrentavam crises no campo em outras regiões do país, movimento que resultou no surgimento de várias cidades na região Norte de Mato Grosso e na expansão da fronteira agrícola, transformando o estado no campeão de produção de grãos e carnes.
Inserem-se nesse contexto os assentamentos rurais, que começaram a surgir no estado no final da década de 1970, como é o caso do primeiro assentamento criado em parceria entre o Incra e a iniciativa privada em terras devolutas no então município de Colíder.
Em toda essa história, há inegáveis conflitos entre populações tradicionais, indígenas e trabalhadores sem-terra, além da ocupação ilegal de imensas áreas e da exploração irresponsável dos recursos naturais.
Naquela época, o estado recebeu um grande volume de recursos e programas especiais ((PIN, PROTERRA, POLOCENTRO, POLAMAZÔNIA e POLONOROESTE), que mais serviram aos grandes grupos econômicos do que propriamente ao trabalhador rural.
Mas quero centrar atenção na reforma agrária. As primeiras terras desapropriadas no Estado com essa finalidade foram na década de 1980. O Incra, criado em 1970, chegou a ter sob seu domínio 60% das terras no Estado. Nos anos seguintes, promoveu a distribuição dessas terras, para colonização oficial ou particular, atendendo a estratégia de ocupação da região amazônica.
Cidades inteiras surgiram como resultado dessa ação. Vou citar o exemplo de Lucas do Rio Verde. Os primeiros colonizadores chegaram na segunda metade da década de 1970, durante a abertura da BR-163 (que liga Cuiabá a Santarém). O projeto de assentamento do Incra trouxe para a região 203 famílias de sem-terra do Rio Grande do Sul, que ocuparam lotes de 200 hectares. Com o passar dos anos, essas famílias deram origem ao núcleo urbano, que hoje se transformou em uma das melhores cidades do País para se viver e investir.
Durante décadas, a ocupação de terras por famílias de trabalhadores rurais registrou avanços, mas nem todas as experiências tiveram resultados positivos como é o caso de Lucas do Rio Verde. No começo desta década, haviam sido implantados centenas de projetos de assentamentos rurais em Mato Grosso e, pelos cálculos de hoje, existem pelo menos 100 mil famílias morando no campo.
A implantação desses assentamentos pode ter diminuído momentaneamente a tensão social, mas não resolveu a situação do trabalhador rural, que continua convivendo com a pobreza, a falta de infraestrutura, de acesso ao crédito e de apoio institucional. Mais que isso: até hoje não conta com a regularização de sua situação fundiária. Em outras palavras, não receberam o título de propriedade. Tudo isso impede que avancem em sua condição humana.
Criado pelo governo federal em 2009, o Programa Terra legal tinha o objetivo de titular a propriedade de terras públicas que tenham sido ocupadas por posseiros antes de dezembro de 2004. Mas essa legislação continuou a trazer algumas dificuldades para o trabalhador rural.
Tratei desse assunto, por diversas vezes, com a Presidência da República e, em julho deste ano, uma Medida Provisória atualizou o Programa Terra Legal, com impactos positivos principalmente nos critérios de enquadramento da clientela da reforma agrária. Até então, um cliente estava quase impedido de avançar em sua condição humana e econômica. Por exemplo: ao fazer um curso de professor, o trabalhador rural estava excluído do programa, mesmo ocupando a terra há décadas. O que falar, então, se ele resolvesse se casar com uma pessoa que tivesse uma renda melhor. Isso significava que – uma vez cliente da reforma agrária – não poderia progredir socioeconomicamente.
Isso agora mudou. Prova disso é a aprovação de emenda de minha autoria QUE permite aos assentados PARTICIPAR DE projetos da agroindústria. Em outras palavras, eles podem fazer parte de um processo produtivo mais amplo, como no papel de fornecedores de matéria-prima para uma agroindústria. No caso do frango, isso permitiria uma receita a cada 45 dias.
Outro avanço está na simplificação do processo de regularização, que pode ser concluído em até 120 dias a partir do cadastramento da posse. Isso se traduz em segurança jurídica e acesso ao crédito. Mas, nem tudo saiu como sonhado. Em Mato Grosso, somente 450 títulos foram emitidos desde então (2009). A demanda era de 5 mil títulos só dentro do programa Terra Legal. Outros 19 mil títulos já emitidos estão emperrados nos trâmites burocráticos.
A principal conquista com o título da propriedade é a segurança jurídica. O direito sobre a terra é reconhecido e quem recebe o título não pode vender a área nos próximos três anos, além de ter que cumprir a legislação ambiental.
Enfim, podemos dizer que estamos avançando, mas ainda há muito a fazer. A bancada de Mato Grosso aprovou, para o Orçamento Geral da União, emenda impositiva no valor de R$ 68 milhões A serem aplicados na medição dos lotes da reforma agrária no Estado.
Estamos no caminho que foi traçado, não por nós, parlamentares, mas pelas milhares de famílias que sonham em ver a sua terra produzindo e garantido uma vida melhor a todos.
Wellington Fagundes é senador da República