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A Plataforma Termoquímica Aplicada à Biorrefinaria
Autor: José Dilcio Rocha
12 Dez 2012 - 09:32
Divulgação
A conversão termoquímica de biomassa é uma rota tecnológica que funciona em temperaturas elevadas. O uso de calor é a sua principal característica. A agroindústria brasileira utiliza exaustivamente os processos termoquímicos, sendo que, os seus principais exemplos são a queima de biomassa como casca de arroz, bagaço de cana e cavacos de madeira para gerar eletricidade e calor (cogeração) e a carbonização de lenha para produzir carvão vegetal, importante fonte de energia e bioredutor para a indústria siderúrgica.
Porém, os dois exemplos citados acima não são os únicos. Através da gaseificação e da pirólise rápida de biomassa residual é possível produzir biocombustíveis como bio-óleo, diesel e gasolina sintéticos, via síntese de Fischer-Tropsch, além de fertilizantes como uréia e fertilizantes de liberação lenta. Em todos esses casos existem diferentes graus de inovação tecnológica.
Biorrefinarias é um caminho desejável, mas ainda é um conceito muito acadêmico e precisa ser lapidado para virar realidade e superar as barreiras econômicas. Uma biorrefinaria é uma instalação industrial na qual entra a matéria-prima e saem diversos produtos. Estamos falando de diversificação da produção, integração energética, eficiência energética e de aumento da complexidade das instalações. Por outro lado, a realidade na produção em larga escala nos mostra que o caminho natural para o setor produtivo é o da especialização e isso passa pela produção de um único produto para ganhar competitividade.
Especificamente, no caso brasileiro a saída mais segura para a economia em bases sustentáveis é a inovação tecnológica. Isso significa agregar valor aos nossos produtos primários e não apenas exportar a maior parte da produção na sua forma in natura.
Então, o que seria realmente inovador quando falamos de termoquímica para a geração de bioenergia, produção de biocombustíveis e a fabricação de matérias renováveis? Toda a família de processos termoquímicos é conhecida e como exposta acima já fazem parte de cadeias produtivas importantes na economia do país. O campo fértil da inovação está literalmente aberto e a disposição para o desenvolvimento de novas tecnologias, ou seja, máquinas, equipamentos, dispositivos e sistemas para executarem esses processos e serem inseridos nas cadeias produtivas já existentes ou em desenvolvimento.
O alto risco está inserido na inovação tecnológica. Assim, o desafio de introduzir as inovações necessárias à indústria brasileira será um trabalho conjunto entre os setores públicos e privados objetivando a diminuição desses riscos. Historicamente, a indústria brasileira, a despeito de ser a mais desenvolvida da região latino-americana, é ainda muito dependente dos países desenvolvidos. Essa indústria nacional sempre inovou na produção via importação de máquinas e equipamentos de tecnologias de ponta desenvolvidas em outros países. Assim, o desafio da indústria brasileira é incorporar a inovação gerada localmente seja em laboratórios próprios seja em universidades ou institutos de pesquisa.
O componente inovador da biorrefinaria é ponto de consenso, porém a forma de como atingir essa indústria de produtos e serviços de alto valor agregado é que ainda está em plena discussão. No caso particular do desenvolvimento da conversão termoquímica de biomassa fica bem claro que existe grande demanda pela industrialização dos processos, principalmente a pirólise e a gaseificação, além é claro da própria combustão. No setor siderúrgico com carvão vegetal a demanda é evidente e óbvia. Por se tratar de um setor altamente competitivo e atender completamente o apelo por tecnologias mais limpas e mitigadoras das emissões dos gases de efeito estufa, o carvão vegetal para bioredutor de minérios é candidato privilegiado a incorporar as inovações nacionais.
Para tentar explicar mais claramente a situação singular da siderurgia brasileira a carvão vegetal, é necessário entender inicialmente que esse é um setor energético relevante no Brasil. Trata-se de um setor denominado energo-intensivo, termo que significa grande consumidor de energia. Característica de uma típica indústria de base. A sua grande importância está no fato de ser o substituto natural do carvão mineral, a fonte fóssil que mais polui no mundo inteiro. As características principais desse setor são: baixa inserção tecnológica, baixa qualificação da mão-de-obra e baixo custo da matéria-prima. Existem exceções. E são nessas exceções que estão as respostas para a mudança de paradigma da siderurgia a carvão vegetal. Essa mudança necessária deve ser na valorização da matéria prima passando de extrativismo insustentável para a produção sustentável, na capacitação da mão-de-obra e profissionalização dos técnicos e operadores e na transformação tecnológica que passa pelo abandono dos tradicionais fornos de alvenaria para uma agroindústria tecnificada e com um forte viés de biorrefinaria. Exatamente porque além de produzir o desejado carvão vegetal em bases sustentáveis também produzirá a fração líquida rica em vários produtos químicos de alto valor agregado. São essas as bases para a indústria carboquímica vegetal, na qual não apenas a biomassa lenhosa será a matéria prima, mas também outros resíduos lignocelulósicos poderão ser convertidos em produtos energéticos ou materiais e insumos químicos.
Finalmente, para descrever um pouco em números o significado do setor do carvão vegetal e da lenha no Brasil, e citando os dados do Balanço Energético Nacional, publicado anualmente pela Empresa de Pesquisas Energéticas – EPE – nas suas séries históricas mostra que a produção e o consumo de carvão vegetal são de 10 milhões de toneladas anualmente. O principal consumidor é a siderurgia. A taxa média de conversão adotada é de 25% em massa. Assim, um rápido cálculo mostra que cerca de 40 milhões de toneladas de lenha são consumidas para manter essa produção. Sendo uma produção constante ao longo das últimas décadas e tendo em vista o crescimento econômico do país e junto o aumento do consumo de energia, pode-se concluir que é um setor condenado ao desaparecimento se nada do exposto acima for feito.
O desperdício de 75% da matéria-prima e da energia contida na biomassa lenhosa convertida a carvão vegetal é simplesmente o desperdício da oportunidade de ter a indústria da carboquímica vegetal renovável e sustentável. Assim, será a abundância a nossa maior desgraça ou será que o consenso sobre a inovação na indústria brasileira está sendo erroneamente conduzido?
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