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Afinal, onde será o palco dos debates da Reforma Tributária?

Carlos Montenegro

No dia 20 de dezembro de 2016, foi fechado acordo entre Governo Estadual, deputados da Frente Parlamentar, entidades de classe e representantes dos diversos segmentos empresarias, no sentido de prorrogar as discussões da Reforma Tributária para o início do ano de 2017, de modo que esta fosse aprovada até o fim de junho, e assim, pudesse vigorar a partir do início do 2018.

Tal acordo teve o porquê de ser. Uma das razões foi a apresentação, por parte da SEFAZ-MT, de um terceiro projeto de Lei, substitutivo, aos 48 minutos do segundo tempo, o qual se mostrava completamente distinto dos dois projetos anteriores que estavam em debate (as versões 4.0 e 3.6).

Este terceiro projeto surpreendeu negativamente todos os envolvidos na Reforma Tributária, até porque, pairava sobre o mesmo a enorme expectativa de que este seria a última versão debatida ajustada aos pleitos setoriais e da OAB-MT. Era esperado um PL que trouxesse simplicidade, legalidade, imparcialidade, neutralidade e transparência, sem aumento da carga tributária final. A concretização do mesmo representaria o retorno de Mato Grosso à Federação Brasileira, com a instituição de uma legislação moderna, direta e objetiva.

Ao contrário do esperado, sobreveio sem aviso prévio um texto alienígena, distante do que antes havia sido discutido coletivamente, e pior, com vícios técnicos tremendos, que o afastavam dos princípios sugeridos pela Fundação Getúlio Vargas. Em suma, a versão apresentada consolidaria a liderança de Mato Grosso como a pior legislação de ICMS do Brasil.

Dentro deste cenário, o adiamento das discussões foi medida providencial e inevitável face ao risco de aprovação de um PL temerário e fiscalista ao extremo. Saliente-se o importante trabalho desenvolvido pela Frente Parlamentar em defesa do setor produtivo, que conseguiu segurar a discussão para a 2017, com o suporte de todos os presentes.

Definida a suspensão dos debates em 2016, restou deliberado que logo em janeiro do ano seguinte, a Fundação Getúlio Vargas seria convocada pela SEFAZ-MT para ajustar o projeto às últimas proposições da classe empresária, da própria SEFAZ-MT, da OAB-MT e de alguns parlamentares, sendo que, a partir do início de fevereiro de 2017, as discussões pudessem ser retomadas a partir da versão 3.6., já ajustada. Foi acordado ainda que seria convocada uma nova reunião de trabalho no Executivo, onde seria elaborada uma agenda para continuidade das discussões técnicas e econômicas, até o fechamento do texto que seria remetido à Assembleia Legislativa.

Pois bem. Eis que estamos em fevereiro de 2017 e consultando alguns segmentos e entidades pude verificar que ninguém, até então foi chamado para a continuação dos trabalhos. Tal fato, que nos traz estranheza, foi identificado nesta última segunda-feira, em que li a notícia de que o Governo pretendia enviar o Projeto Substitutivo da Reforma Tributária, juntamente com a Reforma Administrativa, para a Assembleia Legislativa ainda esta semana. O texto que a ser enviado, uma verdadeira incógnita.

Esta questão me deixa intrigado pois, se confirmar tal fato, a Reforma poderá passar por alguns problemas sérios. Por mais que venha a ser amplamente discutida junto aos deputados e que seja dado voz a Sociedade (em reuniões, audiências públicas, fóruns de debates, etc.) no âmbito do legislativo, existem certas limitações de ordem técnica para a realização de emendas significativas nesta esfera.

Certo é que não podem ser feitas emendas parlamentares que descaracterizarem e desnaturalizarem o texto originalmente encaminhado pelo Chefe do Poder Executivo, detentor da competência constitucional para envio de mensagens de natureza tributária, ainda mais quando tais modificações possam impactar o orçamento e arrecadação previstos quando do envio do Projeto ao Legislativo. Isso é muito sério.

Como propor emendas que mudem a alíquota do ICMS sem autorização do Executivo ? Como coibir ilegalidades, se o Executivo previu arrecadação a partir de algumas ? Como autorizar créditos antes vedados se não houve previsão orçamentária ? Todas as questões que tragam impacto fiscal relevante, ou seja, que impactem o caixa do Governo terão obrigatoriamente que ser objeto de substituições do PL via Executivo, ou se assim não forem, serão aprovadas politicamente, sem o devido debate, instituindo uma importante legislação de forma imposta e não consensual.

Além disso, há de ser considerado o seguinte aspecto: Será que as emendas e alterações passíveis de serem feitas na Assembleia Legislativa serão suficientes para que o Projeto de Reforma Tributária venha ajustar-se ao desejo da Sociedade mato-grossense ? Não creio.

Não me refiro aqui ao empenho de nossos deputados, pelo contrário, mas ao formato engessado deste tipo de discussão em um núcleo que depende basicamente de outro. O processo de construção dessa nova legislação corre o risco e de ir e vir várias vezes, o que foi um problema crônico das discussões ano passado. Não podemos repetir os mesmos erros.

Por isso, ao meu ver, seria muito mais produtivo que as discussões sobre a Reforma Tributária fossem mantidas no âmbito do Executivo até exaustão, tal como, aliás, foi acordado com a SEFAZ-MT no final de 2016. Uma vez finalizado o Projeto de Lei, com as conclusões, discussões e composições com a Sociedade, aí sim, que seja o mesmo encaminhado à Assembleia Legislativa para que possa ser melhorado e aperfeiçoado. Muito mais lógico e objetivo que o rito seja desta forma.

Aliás, sugiro que os próprios deputados, como muitos já estão fazendo (Frente Parlamentar), participem das discussões da Reforma Tributária junto ao Executivo, entendendo seu real propósito, sua necessidade, ouvindo os segmentos, entendendo os pontos conflitantes, o que, inclusive facilitaria os trabalhos do Parlamento quando o PL chegar para votação definitiva. Politicamente nos parece uma alternativa muito mais eficaz, que minimizaria desgastes; economicamente, seria um meio de se respeitar os diversos segmentos e suas necessidades; e juridicamente, a oportunidade de se respeitar a Legislação Federal e a Constituição, com proposições sólidas e seguras. O projeto é relevante o suficiente para justificar tal posição.

Por isso indago: Afinal, onde será o palco dos debates da Reforma Tributária ? Cada palco tem uma abrangência diferente e a Sociedade mato-grossense precisa saber quem será o responsável pelas mudanças que virão.

*Carlos Montenegro é advogado tributarista
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