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A utilização de fungicidas na cana

José Otavio Menten

A produtividade de um cultivo agrícola depende de diversos fatores, como variedade, solo, clima, irrigação, técnicas de cultivo, adubação, manejo de pragas etc. As pragas são fatores limitantes do rendimento, impedindo que a planta expresse todo o seu potencial genético. Estimativas conservadoras indicam que as pragas são responsáveis por cerca se 42% dos danos que ocorrem na produção vegetal. Se conseguíssemos controlar totalmente apenas as doenças, já teríamos um aumento de 13% na produção. Existem cerca de 40 diferentes medidas que podem ser utilizadas, simultaneamente ou em sequência, para se reduzir os danos causados pelas doenças causadas por fungos, bactérias, vírus, nematóides etc. Essas medidas podem ser incluídas em métodos genéticos, biológicos, culturais, físicos e químicos. O método químico se baseia, principalmente, na utilização de fungicidas. A maior parte das medidas são preventivas. Depois que uma doença se estabelece, a principal medida de controle é a utilização de fungicidas.

Na maioria das culturas o controle químico é um dos mais utilizados por sua eficiência e praticidade. Entre os cultivos de maior importância no Brasil, a cana de açúcar é uma exceção: os fungicidas são muito pouco utilizados. As doenças são manejadas, principalmente, empregando-se variedades resistentes, obtidas através do melhoramento genético. Este procedimento tem sido suficiente para garantir o cultivo satisfatório em cerca de nove milhões de hectares no Brasil, proporcionando a produção de cerca de 642 milhões de toneladas. Entretanto, essa produtividade, de pouco mais de 70 t/ha, é baixa. A cultura da cana precisa continuar incorporando novas tecnologias para ser sustentável. Já foram obtidos avanços expressivos na utilização da vinhaça, na colheita da cana sem queimadas, na valorização da palhada e do bagaço etc. Está sendo desenvolvido o plantio de mudas no lugar de toletes. Além de ser tradicional matéria prima para a indústria de alimentos (açúcar, rapadura, aguardente) também é importante para a produção de etanol, combustível renovável e pouco poluente, e, mais recentemente, de biomassa para a produção de energia.

Agora está no momento de se validar a utilização de fungicidas na cultura da cana no Brasil. Com a introdução do agente causal da ferrugem alaranjada, o fungo Puccinia kuehnii, em 2009, diversas variedades com boas características agronômicas estão sendo questionadas por permitirem a ocorrência da ferrugem. São cerca de 1,3 milhão de ha (15% da área cultivada) com ocorrência da ferrugem alaranjada nos estados de São Paulo, Mato Grosso do Sul, Paraná, Goiás e Minas Gerais. Estimativas preliminares indicam danos de 20% causados por esta doença. Trata-se de oportunidade de se incorporar, a exemplo do que ocorre nas culturas de soja, milho, algodão, trigo, feijão, arroz, batata, tomate etc., outras alternativas de manejo, seguindo o que preconiza o MIP: Manejo Integrado de Pragas.

Já existem fungicidas registrados no Brasil para o manejo da ferrugem alaranjada. Como se trata de uma mudança na cultura dos produtores e consultores/técnicos, não familiarizados com a aplicação de fungicidas foliares, o assunto tem que ser mais discutido e estudado. Diversos experimentos tem demonstrado os efeitos positivos da aplicação de fungicidas. Outros experimentos estão sendo instalados na presente safra. Há necessidade de se aprimorar a tecnologia de aplicação, seu melhor posicionamento durante o ciclo (momentos da aplicação, número de aplicações etc.), entre outros aspectos.

O necessário choque tecnológico na cana que deverá proporcionar aumentos expressivos de produtividade, essenciais para que a cultura supere a crise atual, exigirá tomadas de posição mais ousadas, rompendo o conservadorismo da atividade e incorporando inovações que tenham mostrado, cientificamente, benefícios significativamente superiores aos custos destes novos procedimentos. A utilização racional de fungicidas foliares pode ser uma dessas mudanças necessárias.

Sobre o CCAS

O Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto.

O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.

Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.

A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça.

Por José Otavio Menten, Diretor Financeiro do Conselho Científico para Agricultura Sustentável (CCAS), Vice-Presidente da Associação Brasileira de Educação Agrícola Superior (ABEAS), Eng. Agrônomo, Mestre e Doutor em Agronomia, Pós-Doutorados em Manejo de Pragas e Biotecnologia, Professor Associado da ESALQ/USP.
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